O pantagruélico Supremo Tribunal Federal
Moraes e seus colegas de Corte precisam entender que a democracia brasileira já cresceu e não precisa de babá em tempo integral
Lamento muitíssimo reconhecer, mas reconheço que, ainda que no princípio as intenções fossem as melhores, supondo que as intenções fossem as melhores, a gulodice judicial do Supremo e de seu onipresente ministro se tornou bulimia punitivista e, no limite, interfere na democracia que ele tanto jura defender.
Ante o inabarcável volume de news e fake news, opiniões e piadas, erros de boa-fé e manipulações deliberadas, pequenas diatribes e grandes declarações, em processos que às vezes têm hora para começar mas não têm ano para terminar, Alexandre de Moraes pretende conter o transbordamento das redes e mídias sociais com a fita crepe do direito penal. Não dá. As regras são – ou serão daqui pra frente – outras.
Como Saturno devorando um filho na pintura de Goya, o onívoro STF engole a legalidade em grandes porções, não distingue os aromas da liberdade de expressão com os fedores da censura prévia, empapa justificativas técnicas com motivações genéricas, deixa passar o ponto das medidas cautelares, azeda o paladar do público e coloca ainda mais fermento na massa já tão sovada da polarização.
Mesmo que, nos últimos anos, as decisões tenham errado e acertado para os dois e os mais lados – o que, a essa altura, não sei se é o caso –, é evidente que, no cômputo geral, o saldo ideológico pesará a favor de quem defende a tese de que o poder judiciário perdeu legitimidade e sabota a democracia. É uma tese oportunista? É. Mas circunstancialmente oportuna.
Claro, sabemos que à direita e à esquerda os populistas chamam de democracia um arranjo qualquer entre o saudosismo do Brasil de Médici e o entusiasmo com a Venezuela de Maduro – como dizia Millôr Fernandes, “democracia é quando eu mando em você; ditadura é quando você manda em mim” –, mas nem por isso deveríamos oferecer a eles os pedaços de verdade com que constroem suas mentiras inteiras.
Os bolsonaristas não gostam, realmente, de liberdade de expressão. Os petistas gostam mais? Até parece. Se pudessem, suprimiriam ou, no mínimo, regulariam, a expressão dos descontentes no primeiro instante. Tal intenção não é sugerida às escondidas: é berrada do alto dos telhados, das legendas, das emendas sem lastro nem rastro.
Mas é justamente por isso que o judiciário deveria frustrar as expectativas dos espertinhos, ser o guardião, não o capataz, da Constituição, deixar que a disputa pública pela verdade corra mais livre e menos tutelada, e que as eleições sejam decididas por votos e não por sentenças. Eu não vou perdoar os onze ministros por me fazerem indiretamente “defender” quem estou defendendo. Na verdade, não é quem, mas o quê estou defendendo. Os mesmos princípios que deveriam ser defendidos pela Corte, a despeito de quem esteja sentado no banco dos réus.
Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.
Comentários (6)
Joaquim
24.07.2025 08:53Judiciário brasileiro está em falta com o país há muiiito tempo. Começou a reagir positivamente com a operação lava-jato e desandou de vez com o livramento do presidente pelo Gilmar e veio a cereja do bolo com os cancelantos do Toffoli. Não vejo mudança no curto e médio prazo.
Maria Das Gracas De Souza Mayrink
23.07.2025 21:07Texto lúcido, bem construído. Parabéns!
Ita
23.07.2025 18:16Palmas!!!
Márcio Roberto Jorcovix
23.07.2025 18:12A democracia como é sabido é o pior sistema de governo, à exceção de todas os outros. É isto. Enquanto não aprendermos que nós ( democratas) temos que evoluir como tal, cobrando e não puxando o saco dos políticos. Pergunte para um bolsonarista quais as pautas econômicas, políticas e sociais defendidas pelos Bozo. Faça o mesmo com os Lulistas. Não sairá nada que se aproveite
Clayton De Souza pontes
23.07.2025 17:22Poético e trágico. Realmente precisamos de uma democracia mais livre
Luis Eduardo Rezende Caracik
23.07.2025 17:16Gustavo, se temos um judiciário assim, o que dizer do congresso e dos congressistas? Um congresso que horas antes de Trump anunciar as tarifas, aprova na comissão de relações exteriores uma moção de regozijo às ações de Trump. Um congresso que mantém em seus quadros um traidor da pátria e que ainda por cima fica procurando formas de manter seu mandato. Um congresso que rouba 50 bilhões dos cofres públicos e os utiliza para corrupção ou para fins eleitorais. Um congresso que contra a opinião de 85% da população decide aumentar o número de deputados. Pense nisso antes de jogar a culpa no STF.