Trate as Havaianas como eu, um judeu, trato o Pink Floyd

23.12.2025

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O Antagonista

Trate as Havaianas como eu, um judeu, trato o Pink Floyd

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Ricardo Kertzman
5 minutos de leitura 22.12.2025 17:49 comentários
Análise

Trate as Havaianas como eu, um judeu, trato o Pink Floyd

Se você usa Havaianas, não mude de ideia porque a empresa é militante ou alguém disse que é. Não coloque sua autonomia nas mãos de terceiros

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Ricardo Kertzman
5 minutos de leitura 22.12.2025 17:49 comentários 3
Trate as Havaianas como eu, um judeu, trato o Pink Floyd
Foto: Reprodução de vídeo

Escrevo profissionalmente já há dez anos, e confesso que ainda mantenho certa dificuldade em – quando algo me consome e me enche de revolta – me concentrar e não deixar a emoção embaralhar e obscurecer o pensamento (como agora), impedindo que eu transcreva minhas ideias e leve uma adequada reflexão ao leitor, que é o objetivo de quem escreve publicamente, com as devidas responsabilidade e honestidade intelectual.

Não faço a menor ideia se a Alpargatas, uma empresa com mais de 115 anos de história e muito sucesso comercial, é dirigida por pessoas de esquerda e, sendo, se essas pessoas são militantes o suficiente para misturar negócios com política. Via de regra – e até mesmo pela minha própria experiência profissional em empresas de grande porte – não é o que acontece. Dinheiro não costuma ter partido político.

Contudo, em um país que se perdeu, há décadas, em corporativismo, fisiologismo, individualismo, corrupção, histeria, preconceito, ódio, dissonância cognitiva em último grau, abstrações de toda sorte e completa falta de objetivo e pragmatismo, mesmo em importantes corporações e em meio a executivos experientes, sim, é possível o contágio político ou mesmo cálculo comercial temerário.

Filme repetido

Neste sentido, a Alpargatas, dona da marca mundialmente famosa Havaianas, ao produzir e veicular sua campanha de final de ano, pode ter pretendido misturar política com marketing. A peça, estrelada pela atriz, também mundialmente famosa, Fernanda Torres, parece ser uma forma de provocação, ou crítica velada, à direita, mas, independentemente disso, e é onde quero chegar e analisar, pergunto: e daí; o que importa?

Se o pé direito é uma superstição nacional, qual o problema em usá-la como mote de campanha? “Ah, Ricardo, não seja ingênuo, foi proposital”. Sim, pode ter sido e já reconheci acima. Mas a pergunta persiste: e daí? Qual o problema? Qual o sentido em transformar isso em pé de guerra? Lembrando que antigas propagandas da mesma marca também causaram alvoroço, mas entre os – como é mesmo? – conservadores de bem.

Era uma propaganda em que uma atriz, no auge da fama e da beleza, na praia, era “chavecada” – hoje seria considerado assédio –  por um pré-adolescente. À época, acusaram a marca de adultizar e sexualizar a infância. Coincidência? Que nada! As histórias se repetem, pois os seres humanos evoluem – quando evoluem – muito lentamente. Uma propaganda de cigarros também enfrentou a mesma patrulha ideológica nos anos 1990.

Um judeu como exemplo

O que me espanta, nesse caso, é a emoção da galera. Parece que o clube de coração foi roubado em uma final de Mundial. Catzo! Gente que adora – com razão – acusar a esquerda de patrulha ideológica, faz o mesmo. E não é a primeira vez, como não será a última. Outro dia, saíram pedindo a cabeça, ou melhor, o emprego de pessoas que grotescamente zombaram da morte do ativista político Charlie Kirk, brutalmente assassinado nos EUA.

São os sedizentes defensores da liberdade de expressão. Aqueles que juram defender a democracia acima de qualquer coisa. Na boa, não compreendo por que deixar que situações sem a menor importância fática invadam sua esfera pessoal. Se as sandálias são de boa qualidade, confortáveis, hypadas, acessíveis e tudo mais, por que deixar de usá-las – ou ficar berrando em rede social – por causa da propaganda dúbia?

Como judeu, abomino a militância antissemita de Roger Waters, da antiga e imortal banda inglesa Pink Floyd, mas não perco um show do sujeito quando posso ir. Se um dia encontrar com o dono do Madero, direi que agiu como um babaca no início da pandemia, mas adoro e continuo devorando seus hambúrgueres. E se eu tivesse grana pra comprar um Jaguar F-Type, o compraria na hora – e que se dane a tal campanha woke mal-sucedida.

Seja você mesmo

Como canta Lulu Santos em De Repente Califórnia – outro por quem não tenho a menor admiração, exceto a musical -, “Na minha vida ninguém manda, não”. Ou melhor, madam minha esposa e filha (mamãe já morreu). Está para nascer político, ou influencer de TikTok, para me doutrinar. Aliás, no momento em que me compreendi como indivíduo pleno, autônomo, seguro, passei a me guiar única e exclusivamente por minha consciência.

Pode até existir atleticano tão apaixonado quanto eu, mais atleticano, jamais. O dono da SAF do Cruzeiro é proprietário de uma rede de supermercados. Pois bem. Se tiver cerveja e picanha em promoção por lá, eu vou correndo. “Ah, Ricardo, ele ficará mais rico e colocará mais dinheiro no rival”. Que pensamento estúpido, tacanho! Se fosse assim, nenhum cruzeirense seria correntista do banco do dono do Galo ou moraria em um Minha Casa, Minha Vida.

Por isso, se você gosta e usa Havaianas, não mude de ideia porque a empresa é militante ou porque alguém disse que era. Isso significa colocar seu gosto, sua identidade, sua autonomia nas mãos de terceiros. O Brasil já tem Alexandre de Moraes, Lula, INSS, Toffoli, rachadinhas, bananinhas e outras mazelas bem mais sérias para a gente vigiar, cobrar e criticar. Isso, sim, é ser cidadão. Boicotar quem pensa diferente não passa de intolerância e autoritarismo.

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Ricardo Kertzman

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Comentários (3)

Marian

22.12.2025 20:34

Quem é o CEO das havaianas? É verdade que integrou o CDESS? Isso poderia ser encarado como propaganda eleitoral antecipada?


Edson Barbosa

22.12.2025 19:36

Não comece o ano com o pé direito. Nem com o pé esquerdo. Comece o ano com o pé Brasileiro! Agradeço Ricardo. Como sempre, você deu uma aula.


Edson Barbosa

22.12.2025 19:21

A tua análise Ricardo ( me permita a intimidade porque não o conheço, apenas teus comentários), seria válida em qualquer país do mundo livre civilizado, MENOS EM BANÂNIA !!! Por aqui, as coisas são exatamente da forma que descreveste, porque aqui lidamos com mentes miúdas e incapazes de pensar nas consequências dos seus atos ( até contra si mesmas ), e manipuladas COMO ZUMBIS, por estelionatários políticos, religiosos e jurídicos, cujo único foco é O PODER !! Enquanto tivermos BANDIDOS DE ESTIMAÇÃO, só eles ganham e o gado emagrece e até morre !!!!


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